O Livro dos 5 Anéis — Miyamoto Musashi no estilo de vida pessoal e coletivo (parte 1).

Malokêarô
4 min readJun 6, 2021

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Cena aleatória do Mangá Vagabond

Por que Musashi e por que agora?

Em 2008 ou 2009, ainda com 16 anos, comprei um box de livros intitulado “O Essencial da Estratégia”. Eram três livros, O Príncipe, A Arte da Guerra e O livro dos Cinco Anéis. Comprei porque na época eu estava imersa na cultura das artes marciais, no meu segundo ano do Ninjutsu, indo no Anime Friends e passando os finais de semana na Liberdade. Meu lance era com o Sun Tzu, mas nunca terminei o livro. Terminei Maquiavel por conta da faculdade e, nesse ano, bem agora, conhecendo mais de Marighella, lembrei de Takezo (do mega romance “Musashi” escrito por Eiji Yoshikawa) e senti a necessidade de retomar esse livro.

O Livro dos 5 Anéis é o escrito de Musashi sobre os mandamentos da Arte Militar. Por exemplo, enquanto que o “Manual do Guerrilheiro Urbano” são os mandamentos do Guerrilheiro Urbano segundo Marighella, Musashi nos dá a letra de seu corre: um Rônin cujo objetivo é a perfeição de si e a compreensão da luta.

Eu espero que você tenha a oportunidade de ler este livro, traduzido por José Yamashiro e tão bem me apresentado. Considerei a leitura como um portal, que me reconecta comigo e me dá mais chaves sobre como viver e ver a vida.

Tenho tentado me aproximar de tudo o que não é ocidental, e apresento para quem me lê, os primeiros princípios com os quais consegui me conectar nessa leitura. A começar pelo capítulo 1 — Terra.

1 — A chave da vitória está no espírito e na consciência do corpo: a cena que Musashi nos dá é de 1600, com senhor feudal, espadas, duelos e muita honra, nada muito diferente de 2021. Por isso a vitória começa dentro, com a teoria e a prática diária até que aquele movimento com a espada esteja em perfeita sintonia com o seu corpo.

Musashi traz os elementos Terra, Água, Fogo, Vento e Vácuo como capítulos dos aspectos da Arte Militar, e eu não pude deixar de pensar no meu comportamento e no nosso comportamento coletivo diante do sistema.

“Não só o samurai, como também o sacerdote budista, as mulheres, ou mesmo o camponês e a gente de categoria inferior a ele, todos devem reconhecer o sentido de obrigação. Ao praticar os mandamentos da arte militar, o samurai deve ter por princípio superar em tudo a todos os demais, vencendo em duelo individual ou em combate com vários adversários.” (página 44)

No capítulo Terra os princípios da arte militar são apresentados e relacionados com a arte do carpinteiro ou artesão, que faz seu trabalho com cuidado, conhecimento e técnica. Hoje percebo que há pouco espaço para o tempo do cuidado, do conhecimento e da técnica. Mais a frente no livro, Musashi também apresenta a diferença entre fazer rápido e fazer apressadamente, e como é ruim fazer algo de forma apressada, principalmente na luta.

Independente do sistema em que nossa comunidade esteja vivendo, é preciso saber do jogo que se joga nele. Por isso que hoje eu entendo com mais jeito as mandingas de quem viveu na escravidão e de quem viveu no pós escravidão anterior à minha existência. Quem sabe jogar vive e prospera, para manter a chama acesa. Mas antes do conhecimento do jogo deve vir o sentido de obrigação com a comunidade. Quem não tem esse sentido pode até prosperar, mas nunca irá vencer.

“Dentro dos nossos mandamentos, vencemos em combate sobretudo por conhecer bem o ritmo do inimigo, contrapondo-lhe então um ritmo que ele jamais poderia esperar, criando um ritmo de vácuo nascido da sabedoria”. (página 62)

Há muita respiração nos movimentos do corpo com a espada, e esse ritmo do ar no corpo é que determina nossa intensidade. Se nós temos um inimigo, observamos o ritmo dele? Como ele observa o nosso ritmo? Aqui na nossa geração, as coisas acontecem em baixo ou alto grau, nos indignamos, as vezes saímos às ruas, mas quem dita esse nosso ritmo? Além do ritmo midiático, quem dita nosso ritmo alimentar ou laboral? Em todos os capítulos Musashi pede para que meditemos bem sobre todos os assuntos. E sim, é necessário pensar sobre os controles invisíveis que limitam a autonomia do nosso espírito.

Para terminar o capítulo Terra, Musashi nos dá os seguintes mandamentos (sempre lembrando que o corre é: direto e reto, sem curvas):

1 — Evitar todo e qualquer pensamento perverso (dica: escute Jorge Ben)

2 — Treinar dentro dos preceitos da escola Nitô-Ichi

3 — Conhecer muitas artes — não só a arte militar (dica: abrir a cabeça)

4 — Compreender os mandamentos das diversas profissões

5 — Discernir as vantagens e desvantagens que existem em todas as coisas

6 — Desenvolver a capacidade de discernir a verdade em todas as coisas

7 — Conhecer pela percepção instintiva coisas que não podem ser vistas (dica: ligue o radar)

8 — Prestar atenção aos menores detalhes

9 — Nada fazer de inútil (dica: não perca seu tempo).

Talvez eu aprofunde mais capítulos ou mais sobre o mesmo capítulo conforme eu leio e releio o livro, mas fica o gostinho.

Nessas duas experiências, de ler Musashi e Marighella no mesmo período, me conecto um pouco mais ao sentido de aperfeiçoamento individual e coletivo, e sinto que isso merece ser compartilhado.

Bruna Tamires

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Malokêarô

A minha idade não sabe quando começou, muito menos quando pretende terminar.